Analisamos a suplementação com sais de cetonas e os seus potenciais efeitos ergogénicos. É possível tomar cetonas exógenas?
A cetose é um estado fisiológico induzido por um componente nutricional.
Quando restringimos significativamente a ingesta de hidratos de carbono, o organismo começa a diminuir os seus depósitos de glicogénio (glucogenólise), ou seja, já que não me dá… Eu uso o que já tenho…
Índice
O que acontece quando nossas reservas de glicogénio são baixas?
Embora, as reservas de glicogénio que o organismo é capaz de armazenar são limitadas (ver figura I) pelo que a função de:
- as demandas energéticas do sujeito; e
- o estado prévio destes depósitos
Estas reservas podem vaziar por completo em apenas uns dias.
Figura I. Conteúdo do glicogénio no fígado e o músculo. (Adaptado de Hargreaves, 2012; em Murray & Rosenbloom, 2018)
Quando acontece isso, o organismo esta submetido a prescindir do principal substrato energético do SNC e que utiliza para a resíntese de ATP no trabalho mecânico de intensidade moderada.
Esta oxidação de ácidos gordos podem chegar a acumular demasiada quantidade de Acetil-CoA na mitocôndria.
Também pode acontecer que ao deixar de produzir a glicólise na citoplasma, cessa a sua conversão a piruvato, o qual atúa como precursor (via carboxilação) do oxalacetato um intermediário que pode chegar a limitar a produção de ATP (energia) no ciclo de Krebs.
A Acetil-CoA produzida pela oxidação de ácidos gordos começa a acumular na matriz mitocondrial, onde começa a sofrer uma série de processos que transformam o excedente gerado em:
- Acetoacetato,
- Acetona,
- Beta-Hidroxibutirato.
Estes corpos cetónicos podem ser utilizados como fonte energética pelos órgãos que não dispõem de glicose para a resíntese de ATP (especialmente no cérebro).
Figura II. Metabolismo da cetogénese e o seu impacto no metabolismo energético. Recuperado de: https://www.fisiologiadelejercicio.com/wp-content/uploads/2017/08/cuerpos-cetonicos.png
O que é BHB ou Beta-Hidroxibutirato?
A Acetil-CoA que começa a acumular na mitocôndria por excesso da sua produção ou falta de metabolitos intermediários, não pode ficar assim, pelo que o corpo começa a transformar até que obtém Beta-Hidroxibutirato.
Trata-se de um corpo cetónico que tem mais presencia no organismo porque é o mais reduzido de todos, isto quer dizer quer o Beta-Hidroxibutirato atúa como provisão energética, circulando pelo organismo até que uma célula requer energia.
Este corpo cetónico entra na mitocôndria celular onde sofre um processo inverso:
Beta-Hidroxibutirato -> Acetoacetato -> Acetoacetil-CoA -> Acetil-CoA
Temos a Acetil-CoA, esta vez, sem a presença de um excesso da mesma e com a disponibilidade de completar o ciclo de Krebs, podemos utilizar para voltar a a produzir ATP (energia)
Sais de Cetonas, por que usar
Em primeiro lugar temos que compreender que um excesso na produção de corpos cetónicos serão eliminados a través da urina, já que a sua acumulação no plasma sanguíneo pode alterar o PH e produzir uma situação de acidose gerada por presença de corpos cetónicos (cetoacidose).
Grande parte do corpo de evidencia que intentou demonstrar que a administração exógena de sais de cetonas aumenta o rendimento desportivo fracassou, como é o caso de O’Malley et al. (2017), em grande parte porque o grupo experimental é comparado com um grupo controle ao que não a induzido um estado de cetose; e sua administração sem condições de restrição glucídica carece de sentido para este fim.
A pesar de que há leitores que rejeita essa ideia… A cetose é um estado fisiológico que tem interesse clínicos, más não o rendimento desportivo, há que o tempo até o esgotamento numa prova de esforços esta diretamente condicionada pela quantidade de hidratos de carbono consumidos na dieta e, por tanto, da disponibilidade de obtenção de energia a través da glicólise (Véase figura II).
Figura III. Relação entre oxidação de glicose, gorduras e duração do exercício até o esgotamento em dietas com diferentes configurações nutricionais. (Guyton & Hall, 2016)
Consumo de Sais de Cetonas antes do treino
Em primeiro lugar, aumentar as concentrações séricas de corpos cetónicos a mediante o consumo de 0.3g/kg de peso de B-Hidroxibutirato pré-treino aumenta a oxidação de ácidos gordos no corpo em um 23%, e reduz a oxidação de glicose um 8%:
Figura IV. Oxidação total de hidratos de carbono (CHO) e gorduras (FAT) no grupo controle (placebo) vs experimental (ketone). (O’Malley et al. 2017)
O que nos diz isto?
- Que consumir sais de cetonas nas doses anteriormente indicadas antes de treinar podem resultar uma ajuda ergogénica interessante para aumentar a oxidação de ácidos gordos e, por tanto, para a redução da massa gorda do sujeito
- Assim como pode ser uma estratégia interessante para produzir uma “poupança” do glicogénio orgánico em competições onde sua integridade é um determinante do rendimento, já que reduz sua oxidação
Sais de Cetonas VS Esteres
Até agora falamos do consumo de sais de cetonas, isto é simplesmente assim por que é o formato mais facilmente acessível para consumir B-Hidroxibutirato (BHB)
Embora, um estudo realizado por Stubbs et al. (2017), no qual administrarão cetonas em forma de sais e éster, parece indicar que as concentrações séricas do corpo cetónico são maiores quando se consume em forma de éster e não de sal.
Figura V. Concentrações séricas (medidas em mMoles) de D-Beta-Hidroxibutirato desde o consumo até 4 horas depois de diferentes formas de administração: éster alta dose (círculo vazio); éster baixa a dose (círculo recheio); sais alta dose (quadrado vazio); sais baixa baixa dose (quadrado cheio). (Stubbs et al. 2017)
A excreção urinaria de cetonas é significativamente maior no formato éster que nos sais, pelo que consumir éster de cetonas parece ser que embora aumenta as concentrações séricas de D-Beta-Hidroxibutirato em maior medida que os sais, também gera uma maior degradação de substância, pelo que o resultado final é similar.
Figura VI. Concentrações séricas (medidas em mMoles) de ácidos gordos livres (A), Triacilglicerol (B) e Glicose (C) desde o consumo até 4 horas depois de diferentes formas de administração: éster alta dose (círculo vazio); éster baixa a dose (círculo cheio); sais alta dose (quadrado vazio); sais baixa dose (quadrado cheio). (Stubbs et al. 2017)
Conclusões
A pesar da já discutida superioridade do consumo de éster de cetonas sobre os sais de cetonas, ambos mostraram os efeitos similares com diferencias não significativas
A ingesta de bebidas de sais de cetonas diminuíram significativamente as concentrações plasmáticas de ácidos gordos(de 0.7 a 0.4mM), triacilglicéridos (de 1.1 a 0.9mM) e glicose (de 5.7 a 4.8mM) depois de uma hora, voltando a normalidade após 4 horas do consumo.
Embora estes resultados mostram que a administração de cetonas exógenas podem ter benefícios clínicos em populações que apresentam patologías metabólicas.
Fontes Bibliográficas
- Hall, J. E., & Guyton, A. C. (2016). Guyton & Hall Compendio de fisiología médica (12a. ed.). Barcelona [etc.]: Elsevier.
- Murray, B., & Rosenbloom, C. (2018). Fundamentals of glycogen metabolism for coaches and athletes. Nutrition Reviews, 76(4), 243–259
- O’Malley, T., Myette-Cote, E., Durrer, C., & Little, J. P. (2017). Nutritional ketone salts increase fat oxidation but impair high-intensity exercise performance in healthy adult males. Applied
- Trevor O’Malley, Etienne Myette-Cote, Cody Durrer, Jonathan P. Little. Nutritional ketone salts increase fat oxidation but impair high-intensity exercise performance in healthy adult males.
- Stubbs, B. J., Cox, P. J., Evans, R. D., Santer, P., Miller, J. J., Faull, O. K., … Clarke, K. (2017). On the Metabolism of Exogenous Ketones in Humans. Frontiers in Physiology, 8, 848.
Entradas Relacionadas
- Gorduras como combustível em alta intensidade?
- Dieta cetogénica em desportos de força
- Flexibilidade Metabólica: Como ajustar a tua dieta e melhorar o rendimento
Oxidação dos ácidos gordos - 98%
Reduzir degradação massa muscular - 97%
Poupança glicogénio - 100%
Efeito agudo - 100%
99%